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Anadia // Bairrada  

Censos Sénior 2014: GNR “combate” isolamento e solidão na região

O Comando Territorial da GNR de Anadia tem em curso, entre 15 de janeiro e 15 de fevereiro, a terceira edição da “Operação Censos Sénior 2014”. Um trabalho que vem sendo desenvolvido nos últimos anos, a nível nacional, com o objetivo de atualizar os dados sobre os idosos que vivem sozinhos e/ou isolados.
A GNR de Anadia está no terreno, nos concelhos de Anadia, Oliveira do Bairro, Mealhada e Águeda (povoação de Fermentelos) a atualizar o registo relativo a esta faixa etária, mas também a identificar e registar todas as novas situações que vão surgindo.
São semanas a calcorrear as zonas serranas destes concelhos, alertando ainda esta franja da população para situações que podem representar perigo. Uma ação de sensibilização que pretende incutir nos mais idosos a necessidade de adotarem comportamentos de segurança por forma a evitar situações de crime (furto, roubo, burla.

A viatura da GNR para junto à porta de uma habitação, localizada na zona serrana do concelho de Anadia. Estamos na freguesia da Moita e num lugarejo com meia dúzia de casas habitadas, sobretudo por idosas, quase todas viúvas. A exceção são dois ou três casais mais novos que ali residem.
Os três militares saem do carro numa rua íngreme. Não se vê ninguém. Batem à porta de Ema (nome fictício). Do alto dos seus 82 anos, Ema desconfia e não abre a porta à primeira, sem antes se certificar quanto às verdadeiras intenções dos visitantes. Todos os cuidados são poucos, pois no ano passado “voaram” de dentro de sua casa 1500 euros. “Dois burlões deram-me a volta. Pararam o carro, vieram com muita conversa e diziam que vinham da Segurança Social para trocar notas de 50 euros”. Assim que eles saíram com o dinheiro, Ema ainda ligou para a GNR mas já era tarde. A partir daí desconfia de tudo e de todos: “nunca fiando”.
Em alerta permanente, hoje, diz que nem sabe como caiu no conto do vigário. Viúva há nove anos, é mãe de quatro filhos espalhados pelo país e estrangeiro. Todos se preocupam com ela e está sempre em contacto com eles. Sempre é como quem diz. Está há mais de uma semana incontactável por ter uma avaria no telefone fixo e foi durante esta visita que os militares da GNR lhe tentaram resolver o problema, ligando para a operadora. Ficou a promessa de que a avaria, no exterior, já estava registada para arranjo com caráter de urgência.
“Sem telefone, sem filhos perto, com mobilidade reduzida, esta idosa está completamente desprotegida”, admite o cabo Vítor Marques, habituado a lidar com estas situações. A Ema valem-lhe alguns vizinhos que moram ali perto e que vão procurando por ela, sabendo da sua saúde e se precisa de algum tipo de ajuda.
“Sempre que me ausento ou vou ter com um dos meus filhos, aviso os vizinhos”, mas lamenta que para ir a Anadia, sede do concelho, a escassos 15 quilómetros, tenha de aguardar pacientemente pela carrinha que vem buscar os miúdos para a escola ou então alugar um táxi: “mas o táxi é muito caro e só para me trazer cá acima leva 15 euros”, diz.
A pensão, muito reduzida, vai dando para pagar as contas (água, luz, telefone), comer e para os medicamentos e idas ao médico.

“Daqui não saio”. Umas casas mais adiante, numa outra rua íngreme, Matilde (nome fictício), de 76 anos, não para em casa. De estatura pequena, vê-se que é uma mulher rija, cheia de genica. Andava a dar às galinhas num anexo perto de casa.
Viúva há já 15 anos, tem os filhos por perto (Mortágua e Malaposta) mas passa os dias só, a tratar da lida da casa e no campo e a dar apoio à irmã, de 90 anos, que trata carinhosamente por “madrinha”.
“A minha irmã mora sozinha. Não sai muito. Vou lá todos os dias a casa. Dou uma limpeza, acendo a braseira e faço companhia. Ela não quer ir para o Lar”, diz com alguma aflição por receio de uma queda ou de que algo mais grave lhe possa acontecer.
Aos militares, que já conhece de anteriores contactos, fala de gente estranha que por ali vai passando, sobretudo no verão, mas também de um estranho furto de galinhas por um casal que por ali vai aparecendo.
Sem demonstrar receio, diz que daqui também não quer sair. Esta é a terra onde nasceu e onde morou toda a vida.
Lamenta o isolamento, a falta de gente nova e de transportes para ir a Anadia com mais frequência.

Para muitos, o único contacto. Estes dois casos são para os militares da GNR (Vítor Marques, Carlos Lopes e Vera Clementinho) dois exemplos do que encontram por essas povoações fora. Idosos, a viver sós, muitos deles isolados. Alguns ainda vão tendo o apoio (de longe) de familiares, mas muitos não têm ninguém, já que os filhos estão emigrados. Por isso, o cabo Vítor Marques fala da importância deste tipo de contacto: “eles conversam, pois sentem-se muito sós, devido ao isolamento. Nós quebramos a solidão”, mas não deixa de recordar uma das situações que mais o marcaram. Numa povoação da área de intervenção existe uma localidade onde reside apenas uma pessoa idosa, evidenciando a fragilidade destas pessoas.
Por isso, admite que em algumas situações “o único contacto que alguns destes idosos têm é com os militares da GNR que patrulham a área”, sublinhando a importância deste tipo de programas que acompanham e atualizam os dados da população que vive em situações de maior isolamento mas que também serve de elo de ligação com as IPSS locais.
“Somos quatro elementos neste trabalho, mas os postos locais também nos dão informações. Somos o elo de ligação com as IPSS no apoio a muitos dos idosos”.
A área de abrangência é grande e com uma zona serrana enorme. Escoural, Saidinho, Saide, Fontemanha, Amieiro, Algeriz, Corgo e Padara, todas no concelho de Anadia são lugares de passagem e paragem obrigatória.
Daí o trabalho ter de ser feito consistentemente e ao longo do ano: “o nosso trabalho continua mesmo depois dos Censos. Durante o ano vamos localizando pessoas e alimentando a nossa base de dados”, acrescentou.

Excepção à regra. Numa das povoações serranas do concelho de Anadia fomos encontrar um jovem casal que contraria a tendência da maioria dos casais jovens que optam por abandonar estas localidades isoladas e interiores, à procura de melhores condições de vida.
Marian Silvester, de 46 anos e o marido Karl Bartlett, de 52 anos, escolheram estar longe de tudo e de todos. Há três anos compraram uma casa que estava para venda e fixaram residência numa povoação onde não residem maioritariamente viúvas, em pequenas e humildes casas isoladas.
De origem escocesa, o casal revela que se apaixonou por Portugal, durante os períodos de férias que por cá passou. E que, depois, de muito visitarem, ficaram encantados com esta paisagem do concelho de Anadia e aqui decidiram viver.
“A vista é magnífica”, diz Marian embora a tranquilidade do lugar não a surpreenda, já que no país de origem também viviam no campo, no meio de extensos campos verdejantes. “Acredite que temos mais vizinhos aqui do que lá”, diz sorrindo.
“Compramos a casa e estamos a renová-la”, adianta, ao mesmo tempo que acarinha dois cães rafeiros que acolheu há já algum tempo. São a companhia do casal, que todos os dias sai para passear.
Adoram a natureza e o contacto com a terra, por isso dedicam parte do seu tempo a dar longos passeios pela zona, vão plantando alguns legumes e hortaliças, assim como árvores.
Ambos são vegetarianos e Marian admite que o que se produz em casa tem outro sabor na mesa. O casal que optou por este tipo de vida diferente trabalha, a partir de casa, em projetos ligados a trilhos para BTT e consultoria.
Adoram Portugal e conhecem já algumas das suas cidades, Aveiro, Coimbra, Porto, Lisboa, mas Marian diz que adora o Luso, o Buçaco e as praias da região, Costa Nova e Barra.
Não estando enquadrado nos requisitos para os Censos Sénior, a GNR limitou-se a preencher o formulário referente à ficha de residência isolada que serve para identificar moradias isoladas por forma a combater o aumento do sentimento de insegurança, provocado pela ocorrência de vários roubos com violência a residências, localizadas em zona de difícil acesso.
Os procedimentos adotados passam pela georeferenciação da residência para uma melhor localização em caso de ocorrência, permitindo desse modo direcionar o patrulhamento de proximidade, possibilitado por equipamentos de GPS.

Catarina Cerca