Por: Fernando Marques Pinhal
Não sei
Não sabe ninguém
Porque canto o fado
Neste tom magoado
De dor e de pranto
E nesse tormento
Todo sofrimento
Eu sinto que a alma
Cá dentro se acalma
Nos versos que canto…
“Foi Deus” poema-fado, letra de Alberto Janes”
Como é belo e duro o mundo das palavras! Palavras de amor e de desamor, de engano e de fidelidade, de hostilidade e de paz, de honra e de cortesia, de verdade e de mentira. Palavras dos políticos e da gente e da gente de palavra. É necessário criar palavras honestas, é preciso dizer verdades porque neste contexto é difícil gerar humanidade dentro dos Humanos!…
Enfatizar a contradição permanente existente entre a economia e a cultura como marcas antagónicas, tantas vezes retratada pela disparidade e pela pouca sintonia existente entre as leis culturais e as leis económicas, é dar sentido às palavras na procura da objetividade. Quando se degeneram as palavras, degeneram-se os factos. Sendo a cultura um conjunto de manifestações artísticas, sociais, linguísticas e comportamentais de um povo ou de uma civilização, uma dimensão própria do ser humano que o carateriza pela sua capacidade de produção e de transmissão de valores, de conhecimentos, de símbolos e de tradições e também da língua falada e da língua escrita, a cultura permite-nos saber julgar as coisas, relativizá-las tanto sob o prisma legal, moral, ético e estético, como ao abrigo dos mais elementares princípios e critérios de utilidade, de rentabilidade e de responsabilidade. Por isso, talvez não seja descabido pensar que aquilo que se ensina e se aprende perdura de forma latente no subconsciente individual e coletivo de um grupo ou de uma sociedade.
Se se lê mais e se se ouve mais, é natural que mais e melhor se argumente! Por conseguinte, o papel da comunicação verbal e da interação não se circunscreve exclusivamente ao ato comunicativo, é um fator de afirmação da diferença que deve ser visto como uma mais valia e não como um empecilho ou um problema, deve ser um contraponto à uniformidade populista e à homogeneidade mecânica. Desta forma, a construção dum discurso coerente a nível socioeducativo, afastado duma certa demagogia, talvez seja um ato de rebeldia frente às correntes de opinião dominantes, frente à incompreensão e à injustiça de arquétipos regulamentados por elementos restritivos que, mais do que servir para organizar a sociedade, são um obstáculo ao exercício da liberdade. Por isso, os professores devem ser uma fonte de inspiração para os seus alunos. A ESCOLA não pode nem deve ser sinónimo de humilhação, mas de liberdade, de autonomia e de responsabilidade, de desenvolvimento e de aprendizagem, de formação e de projeção para o futuro, para um futuro incerto, é verdade, mas que já está aqui!
Quando a tecnologia alcança exponencialmente as nossas vidas desde as coisas mais triviais do quotidiano até ao mercado de trabalho, passando pelo I (investigação), pelo D (desenvolvimento) e pelo I (inovação), passando pelas relações interpessoais e intrapessoais e ainda pela comunicação, a força das palavras adquire um significado especial na redefinição e na delimitação do espaço vital de cada um de nós, na estruturação dessa rede ou teia que ampara as nossas emoções. A construção do saber e o desenvolvimento das capacidades não pode estar determinada pela regulação mecânica da aprendizagem nem por interesses circunstanciais, guiados por uma certa lógica matemática ou pela algorítmica genética da inteligência artificial, nem pela quantidade nem pela intensidade dos estímulos, mas pela sua qualidade!
O afloramento dum certo discurso maximalista e extremista, do tudo ou nada, gera desconforto e incompreensão já que nos conduz a patamares de discussão irreconciliáveis onde confluem os interesses individuais e os coletivos, os particulares e os corporativos. É evidente que não vivemos numa arcadia feliz, que há problemas, mas temos de resolvê-los através do diálogo, da confontação de ideias evitando o frentismo belicista, não estigmatizando o contrário e não considerá-lo como um inimigo, apesar de que este epíteto talvez seja o que mais anima e incentiva a sociedade, por absurdo que pareça. É mais fácil destruir do que construir. Por isso, é preciso olhar de frente, cara à cara e de olhos nos olhos, gerar afetos deixando que aflorem os sentimentos mais nobres. Não podemos permitir nem dar-nos ao luxo que se rompam os laços intergeracionais pela falta de comunicação e de confiança. Os meios de comunicação e as redes sociais, esses estandartes da informação e da desinformação, da formação e da deformação, criadores de tendências, atores preponderantes na formação e difusão das correntes de opinião, movem-se dentro da esfera dos sentimentos e das emoções fruto dos interesses particulares que representam, ora defendendo o modelo, ora fomentando a sua alteração e ruptura.
Há uma certa tendência para afirmar que todo o passado foi melhor do que o presente e que o futuro será bem pior do que aquilo que agora conhecemos, enfim, “fica-te mundo cada vez pior”! Este é o reflexo fiel duma geração desconcertada pelo salto que ainda não conseguiu dar e que, neste momento, ainda não conseguiu assimilar as mudanças nem fazer os necessários reajustamentos em tão curto espaço de tempo. Vivemos tempos difíceis e complicados. Fazer frente à pluralidade dos problemas, de forma racional e sensata, implica saber administrar a palavra e as emoções de forma a podermos enriquecer-nos. Para isso, é preciso ceder aqui e ali e também acolá para poder avançar aproveitando essa massa crítica que se expressa nos cafés, nos bares, em casa com a família, nas empresas, nos gabinetes, nas escolas e nos locais onde se exerce e administra o poder… . É necessário recuperar o relato e deixar a um lado os adjetivos, tentar pensar no outro e com o outro, implicando-o e motivando-o nesta árdua tarefa de construir pontes em vez de diques porque, se construirmos muros, mais não fazemos do que separar os problemas, mas não os eliminamos. É necessário que os gestos acompanhem e estejam em consonância com as palavras, que tenhamos tempo para falar, tempo para ouvir e tempo para chegar a acordos, porque desta forma certamente todos nós ganharemos muito mais!
Saber do que se fala e acreditar no que se diz é sinónimo de credibilidade. Neste momento, é preciso ser-se idiota para acreditar naquilo que se ouve, que se vê e que se lê. Mesmo assim, eu quero continuar a acreditar que outra realidade ainda é possível porque… falar não é comunicar nem impôr, mas dialogar!