O ensino particular e cooperativo foi um dos temas abordados na última Assembleia Municipal, não pelos deputados mas pela voz da candidata nas últimas autárquicas à Câmara de Anadia pelo CDS/PP, no período de intervenção do público. A Assembleia decorreu na penúltima quarta-feira, dias antes de ser conhecida a decisão do presidente da República, que promulgou o diploma que regula o apoio do Estado aos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo.
A centrista Maria do Céu Castelo-Branco aproveitaria para intervir, não questionando directamente o executivo mas deixando um recado a Litério Marques, para que o executivo “diligencie no sentido de que estes dois Centros Educativos – Colégio São João Bosco, em Mogofores e o Colégio N.ª S.ª da Assunção, em Famalicão) continuem a prestar o serviço meritório que têm efectuado até à presente data”.
Isto porque, segundo esta professora, “o Ensino Particular e Cooperativo está institucionalizado há cerca de três décadas e o Estado tem apoiado financeiramente estes Centros Educativos, que acolhem milhares de alunos de norte a sul do país”. Instituições que considera fazerem também elas serviço público, para além de que “as famílias devem e podem ter a liberdade de escolher o tipo de ensino que querem para os seus filhos”.
Por isso, enalteceu o papel de duas instituições do concelho: “o Colégio N.ª S.ª da Assunção, em Famalicão, que, presentemente, acolhe cerca de 850 crianças e jovens, e o Colégio Salesiano de S. João Bosco, com cerca de 256 estudantes.”
Maria do Céu Castelo-Branco referiu também que o Governo ao propor o fim dos Contratos de Associação, em vigor, ao longo de três décadas, entre o Ministério da Educação e estas Instituições, “põe em causa, não só a sua continuidade, bem como todo um conjunto de respostas educativas e formativas, que têm servido, também, populações carenciadas, e colmatado a ausência de oferta da Escola Pública, propriamente dita”.
Ao executivo e deputados presentes salientou ainda os “consequentes prejuízos que esta decisão poderá acarretar para os alunos, para as suas famílias, para os professores, funcionários, auxiliares e para a própria comunidade”, pelo que considera que ninguém pode ficar indiferente “a mais este flagelo imposto pela (des)governação de Portugal”.
Câmara quer que o ensino privado prospere. Litério Marques não comentou a abordagem de Maria do Céu Castelo-Branco mas na véspera, durante a entrega dos Prémios Rodrigues Lapa, e a respeito do ensino particular e cooperativo, disse ser um homem de consenso, disponível ao diálogo.
Contudo, referiu não admitir que se aponte à Câmara o problema do público e do privado, pois não tomará posição e manterá a sua postura de imparcialidade quanto aos dois sistemas.
Porém, diz ter orgulho em ter dois colégios privados de referência no seu concelho, sublinhando a todos os docentes e pais presentes na cerimónia que “o concelho espelha a liberdade que existe em termos de ensino”, não querendo o município “ser amputado de qualquer escola”.
Todavia, reconhece que a Câmara está empenhada em dotar o concelho de melhores estabelecimentos de ensino públicos: “fazemos novas instalações de grande qualidade para dar uma resposta efectiva a toda a comunidade educativa”. E, em jeito de recado disse não haver cartas educativas feitas contra quem quer que se seja: “o desejo da Câmara é que o ensino privado prospere”.
Presidente promulga diploma
∑ Foi conhecida esta segunda-feira a decisão do presidente da República, de promulgar o diploma que regula o apoio do Estado aos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo, depois de “um diálogo estabelecido” entre Belém e o Governo que deu origem a um “novo texto”.
De acordo com o site da Presidência da República, o “novo texto” confere maior densificação aos critérios relativos à celebração e renovação dos contratos, consagra o carácter plurianual e renovável dos mesmos por acordo das partes e salvaguarda as condições de transição dos contratos actualmente em execução.
Além disso, “o novo quadro legal não contém matéria que afecte as negociações em curso para determinação do financiamento destes estabelecimentos de ensino, pelo que não está em causa a introdução de imprevisibilidade nas relações contratuais vigentes”.
Presidente da Associação Portuguesa de Escolas Católicas e director do Colégio de Calvão, Querubim Silva, considera que a estratégia do Governo “é, em última instância, reduzir o ensino particular e cooperativo ao ensino de elite”.
O presidente da República foi um dos maiores críticos da decisão do Governo de reduzir o apoio aos estabelecimentos de ensino privado e cooperativo. No entanto, acabou por promulgar o diploma, por se tratar de um “novo texto”. Que reacção lhe merece esta decisão?
Entendo que a única decisão adequada seria vetar o diploma. Acredito que haja alterações significativas no texto. Mas a estratégia subjacente ao diploma é, em última instância, liquidar o Ensino Particular e Cooperativo, ou melhor, reduzi-lo ao ensino de elite. Os motivos de preocupação mantêm-se, dado que os projectos do Governo para invadir todo o espaço escolar, com a requalificação de escolas e a construção de outras, se mantêm…, até que dispense qualquer escola particular ou cooperativa que integre a rede pública. Portanto: a grande preocupação é com a liberdade de aprender e ensinar, a liberdade de escolha de projecto educativo – direito dos pais, que o Estado tem obrigação de apoiar – que acabará, a muito curto prazo, por se extinguir.
Está em marcha, desde 2007, com a criação da Parque Escolar – EP, curiosamente quando, resultado de um debate Nacional sobre a Educação, se recomendou ao Governo que se revisse a Rede escolar integrando o estatal, o particular e cooperativo. A revisão da Rede, prevista na nova legislação, significará, neste caso, o estrangulamento lento, mas irreversível do Ensino Particular e Cooperativo.
Estão salvaguardados os pressupostos que permitam aos colégios funcionar nos moldes actuais?
Neste cenário, é bem claro que a “estabilidade” dos contractos plurianuais nada significa. Porque a redução progressiva do número de turmas contratualizadas, no início de ciclo, conduzirá progressivamente à extinção das turmas subsequentes. E, completados os ciclos, que garantias há de ter um caudal anterior que garanta a continuidade?
No parecer da Presidência da República diz-se que o novo decreto não prejudica as negociações em curso quanto aos custos. Mas é público que o ME continua a divulgar custos sem transparência, foi recusado um Grupo de Trabalho para avaliar e publicar custos límpidos do estatal e do particular. E, pior que isso, a meio de um ano lectivo vem para a mesa das negociações com valores muito inferiores aos pressupostos com que se programou o ano em curso.
Os 11.2% de cortes, como todos (será?) os portugueses terão de suportar, não temos medo de os enfrentar. E aceitamos que sejam revistas contas – de escolas particulares ou cooperativas, mas também estatais – que, porventura “cheirem” a esbanjamento. Mas é evidente que suportar cortes de 20% ou 30%, ninguém consegue.
Equacionam nova reunião de pais e outros interessados, de forma a desenvolver acções de protesto?
As acções de protesto justificam-se até que seja respeitada a Constituição da República de 1982, na qual o Ensino Particular e Cooperativo deixou de ser supletivo do Estatal, para ser alternativo, isto é, para proporcionar o que é normal num regime democrático: a possibilidade de oferta educativa plural, a possibilidade de escolha de projecto educativo. O Ensino Particular e Cooperativo com contrato de associação integra a Rede Pública de oferta educativa. E só pararemos quando isto for uma realidade visível, em perfeita igualdade de acesso.
Catarina Cerca