Os desabafos nas redes sociais da advogada aguedense Joana Canas Varandas, ainda em vida, ganharam uma maior dimensão depois da sua morte, deixando a nu a falta de apoio à doença destes profissionais, assim como a “falta de empatia” e “a indiferença” de alguns juízes perante o seu estado de saúde.
Joana Canas Varandas faleceu aos 39 anos, vítima de doença oncológica. Foi a sepultar esta terça-feira, dia 28. Residia em Paredes, casada, e com um filho de menos de um ano de idade. Chegou a ser candidata do PS à presidência da União de Freguesias de Recardães e Espinhel, em 2017.
Os seus últimos dias não foram fáceis, não só pela luta que travou para combater a doença, como pelas batalhas que travou enquanto advogada, sem apoio à doença e sem a compreensão de alguns juízes, como desabafou a própria nas redes sociais.
O assunto está a mexer com o país, com os relatos da advogada a ganharem outro tom depois da sua morte. Foi num grupo de advogados na rede social Facebook que a advogada de Águeda deixava alguns recados e trocas de impressões com colegas, depois de saber que tinha um “cancro em último estádio”.
Entre outros lamentos, Joana Varandas, com escritório na Comarca de Aveiro, denunciava a falta de apoio à doença que tinha, acusando mesmo de ver condicionados os seus direitos básicos de parentalidade. «… porque o crescimento do meu filho vale muito mais do que um recurso ou uma queixa no CSM [Conselho Superior da Magistratura]», dizia.
A advogada chegou a partilhar uma fotografia sua a trabalhar ao mesmo tempo que recebia tratamento no Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto (ver foto no final da notícia). E noutra publicação deixava clara “a falta de empatia” e a “indiferença” de alguns juízes, que, segundo a própria, rejeitaram requerimentos para adiar diligências, argumentando que poderia ser substituída por um colega.
Perante estes relatos nas redes sociais, esta quarta-feira o Jornal de Notícias encontrou reações de Fernanda Almeida Pinheiro, que enquanto candidata a bastonária propôs a realização de um referendo sobre o carácter exclusivo da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), lamentando a morte da colega, que acabou por falecer “sem qualquer apoio institucional e do Estado e sem que a Justiça pudesse ‘parar’ para a conseguir ajudar” e sem “acesso a uma previdência digna desse nome”.
Numa publicação no Facebook, Fernanda de Almeida Pinheiro apontou o dedo àquilo que chamou ser uma “realidade medieval” vivida pelos profissionais desta área, argumentando que “é ao Estado que compete fazer cumprir a Constituição e não pode continuar a fazer de conta que nada tem que ver com o que se passa com cerca de 40.000 profissionais que são seres humanos como os demais e que escolheram as profissões legais para servir a Justiça. Manter esta situação é denegar a cada um/a deles/as os seus direitos constitucionais de previdência mais básicos”.
As reações tem sido inúmeras desde a morte da advogada de Águeda, com colegas de profissão a lamentarem o trágico desfecho e a referida falta de apoio, havendo mesmo profissionais a falar de “vergonha do sistema” e outros a suspenderem a cédula profissional. “É desumano o que fazem à nossa classe!!! Nenhuma cédula profissional alguma vez será mais importante que o meu direito a viver com dignidade”, refere Carol Alves, advogada de Espinho, numa publicação no Facebook.