O Serviço Nacional de Saúde – que sempre defendi, defendo e continuarei a defender com todas as minhas forças – está muito doente e seriamente em risco. Este que é o bem maior da nossa democracia, um sistema que, bem estruturado, é a garantia que todas as pessoas, independentemente da sua condição sócio-económica, tenham acesso aos cuidados de que necessitam, não está a cumprir o seu papel.
Sou enfermeiro e custa-me assistir ao esvaziamento que está a acontecer no nosso SNS, que deveria ser de todos e para todos. Não assisto. Levantarei sempre a minha voz para defender o SNS e, porque acredito no princípio do acesso livre à saúde, continuarei a defender as populações que devem ter do Estado um serviço de proximidade e atento às suas necessidades. Não me calarei.
Sou sensível e atento a este assunto. É uma área muito cara para mim, enquanto profissional da área, mas também como Presidente de Câmara. Em Águeda, temos investido fortemente para que profissionais tenham as melhores condições para a prestação de cuidados de saúde e utentes tenham um serviço capaz ao seu dispor.
Fazemos o que está ao nosso alcance, proporcionando condições. A dotação de meios humanos, essa continua a ser da responsabilidade do Ministério da Saúde. Em Portugal, segundo dados oficiais do Pordata, existiam, em 2022, um total de 60 396 médicos, quase o dobro dos que existiam em 2000, que eram 32 498. Portugal tem 5,6 médicos por cada mil habitantes, acima da média da OCDE, que é de 3,7.
Dizer que não há médicos – e os números não mentem – isso sim é uma mentira.
Por isso, encerrar e/ou condicionar serviços de urgência por falta de médicos – que, como comprovado, não é verdade – não é admissível. Não me calarei perante isto.
O fecho de serviços de urgência só pode ser um último recurso e representará sempre uma grave perturbação no funcionamento dos serviços de saúde. O que tem vindo a acontecer no nosso Hospital e que já quase se tornou uma rotina, é inaceitável.
Sou Enfermeiro e trabalhei mais de 20 anos numa Urgência. Sei o que é trabalhar horas a fio num serviço exigente e que requer muito de qualquer profissional. Fiz algumas vezes greve, ou porque discordava de algumas políticas ou porque sentia a minha classe profissional injustiçada, mas apenas greve de zelo (trabalhava e não assinava o ponto; logo, não recebia). Nessa altura, tínhamos que garantir sempre os serviços mínimos obrigatórios e era imperativo que a Urgência se mantivesse aberta e a prestar cuidados às populações.
A luta por melhores condições profissionais não pode sobrelevar-se ao dever de cuidar e prestar um serviço que é um direito humano fundamental, o acesso à saúde. Há serviços fundamentais nos Hospitais e as Urgências sem dúvida que o são. São o último recurso para muitos, sobretudo depois de tudo falhar, e todos sabemos que falha.
Foram muitos os governos que adiaram as medidas que se impunham, e sem surpresa, trouxeram-nos a este ponto.
Importa mesmo que na política e na implementação das medidas, as pessoas importem mesmo.
Os serviços públicos são a face mais visível disso mesmo. Os Serviços de Saúde serão, sem dúvida, onde o Estado menos pode falhar.
A Urgência é o reduto e o bastião de um serviço que deveria demonstrar, acima de tudo, humanidade. Se perdermos a Humanidade, o que nos resta?