Vai uma ansiedade na Europa depois da vitória de Trump e das suas ideias isolacionistas, como presidente dos EUA: receia-se, em especial, a imposição de tarifas sobre as exportações europeias e um menor empenho americano na NATO e na segurança europeia. A Europa tem perdido competitividade (como o mostra o relatório Draghi e é evidente, por exemplo, no encerramento de fábricas de automóveis); e sente-se vulnerável, sem os EUA, face à ameaça do regresso do imperialismo russo. Embora com dúvidas sobre o que fará concretamente o novo Governo dos EUA, a Europa deve preparar-se para o pior, está desafiada a mostrar o que realmente vale.
Depois da II Guerra Mundial, a Europa entrou num processo de integração e cooperação entre as suas nações, através da CEE (agora União Europeia) envolvendo políticas comuns, e da EFTA, dedicada apenas ao comércio livre. Assim alcançou um alto nível de bem-estar, sem as guerras em que durante séculos se dividiu. Confiou que, depois do fracasso da União Soviética, a Rússia estava convertida à democracia; não tratou da sua segurança e deixou-se ficar dependente da proteção militar americana.
Nos últimos anos conseguiu enfrentar novos desafios, na crise financeira das dívidas soberanas, na epidemia Covid 19 e no apoio à Ucrânia, adotando novas políticas comuns e fortalecendo em geral a sua coesão. Agora, porém, os desafios são maiores: por um lado, requerem muito mais fundos financeiros e, por outro, envolvem políticas mais sensíveis (por exemplo, no plano da segurança e defesa) que podem reavivar históricas rivalidades. Verdade se diga que estes desafios já se colocavam antes da eleição de Trump; mas depois desta eleição tornaram-se mais prementes.
Não é fácil gerir os diferentes interesses e contextos políticos de 27 Estados-membros da União Europeia; vai decerto obrigar a rever o seu processo de tomada de decisões, para o tornar mais rápido e eficiente. A subida da extrema-direita, inspirada em sentimentos mais nacionalistas do que europeus, não ajuda. E muito dependerá da evolução de alguns Estados decisivos. Por exemplo, na Alemanha, sendo provável uma próxima viragem política à direita, fica a dúvida se virá orientada para o reforço ou para a divisão do projeto europeu; e a mesma dúvida persiste sobre a próxima eleição presidencial na França. Por muita capacidade negocial que se reconheça ao nosso António Costa para aproximar posições divergentes, é evidente que muito se passará e decidirá fora do seu controlo como presidente do Conselho Europeu.
O destino de Portugal está na Europa. Basta lembrar que muito do nosso progresso económico, social e político, em largas décadas, se deveu à participação no processo da integração europeia, primeiro na EFTA, nas décadas de 1960 e 1970, depois na União Europeia. E é no quadro europeu que temos de enfrentar os novos desafios, seja vendo as nossas exportações atingidas pelas tarifas americanas, seja procurando e aproveitando novas oportunidades.
A atual situação política em Portugal, marcada pela fragmentação partidária e perturbada por algumas forças extremistas, não parece a mais adequada para pensar e preparar seriamente o futuro. Com o governo apoiado por uns 30% do parlamento, prevalece a visão do curto prazo, só a pensar em eleições antecipadas, convertendo a folga orçamental herdada do governo anterior em despesa permanente, para satisfazer as exigências de certas corporações e de outros grupos de eleitores.
Mas não faltará muito tempo para perceber que parte dessa folga orçamental será necessária para outras prioridades, a definir no quadro europeu, em especial nos domínios da defesa e segurança e da competitividade económica. Será possível sonhar que os partidos mais responsáveis serão capazes, para além da natural luta política, de entender-se num consenso mínimo para atender a tais prioridades?