Cristina Dias Resende suspira, enquanto contempla uma década de vida que ficou para trás, mas que deixou marcas para o futuro.
Nasceu há 28 anos numa pequena aldeia da freguesia de Nariz, Aveiro, numa casinha sem casa-de-banho nem eletricidade, mas onde passou, afirma, os melhores anos da sua vida. Ali brincou e viveu feliz, “na rua mais bonita do mundo”, Rua do Tojal de Cima, Barreira Branca. Hoje, mora num lugar bem diferente. Grantham, Lincolnshire, Inglaterra.
Casou com Jorge há dez anos, ainda em Portugal, onde nasceu o Cristiano, hoje com nove; a Lara, 5 anos, já nasceu neste novo país. Em 2009, os irmãos mais novos de Cristina juntaram-se a esta família. “Vieram viver comigo, porque em Portugal iriam decerto ter o mesmo destino que eu.”
Destino que Cristina Resende quis contrariar. Contra a sua vontade, é certo. Mas não restava outra alternativa. “Sempre achei que, se estávamos dispostos a fazer tal sacrifício [emigrar] então deveríamos fazer o mesmo no nosso país e sujeitar-nos a piores oportunidades; mas nem essas oportunidades apareceram…” Depois das vendas, do telemarketing, dos biscates, quando conseguiam um trabalho fixo, eram “dispensados”. “Um dia, tive de pedir dinheiro à minha mãe para combustível, de forma a poder levar o meu filho ao hospital e comprar-lhe um medicamento. Dinheiro que ela tinha guardado para pagar a luz, que nesse mês ficou atrasada.” Foi a gota de água.
Partiu então com o marido. Os dois apenas, “pois não sabíamos o que nos esperava”. Partiram em outubro de 2004, com duas malas de roupa, um tacho e 300 euros. Começaram a trabalhar na pior fábrica da zona, 12 horas por dia, no horário noturno, a ganhar menos do que o salário mínimo. “Comemos muito pão rasco e fizemos refeições de pão com manteiga e leite com cereais. Hoje, o que temos é pouco, mas é nosso. Não falta nada aos meus filhos e vejo para eles um futuro melhor.”
Jorge, o marido, trabalha como taxista. Cristina qualificou-se como intérprete e está a meio de um curso universitário em ciências sociais. Tem um Certificado Básico de Ensino de Inglês como segunda língua, área que pretende seguir “assim que possível”.
Nunca se sentiram desintegrados. Apesar das muitas diferenças, principalmente de mentalidade. “As pessoas com mais de 50 anos vão a bares e dançam em clubes; as miúdas de 14 anos são mães solteiras e não é novidade; não é esperado que os filhos tomem conta dos pais na idade avançada; os adolescentes são adultos muito rapidamente…” Nos campos da educação e da saúde, “estamos descansados”. Cristina Resende tem pena dos jovens que, como ela há dez anos, pensam em começar uma família e se veem forçados a adiar esse projeto. Mas considera que Portugal tem de ser um país mais aberto, mais humilde, deixar de ser “um país mimado, que quer tudo agora e já”.
Emigrar “não é fácil”. “Não acreditem em promessas de resolução rápida ou riqueza instantânea.” Mas as “recompensas e possibilidades são infinitas”. Voltar? Não é que não pense nisso, mas… “aqui já estou em casa”.
Oriana Pataco