Assine já

Manuel Armando

Padre

No Desporto, haverá lugar para a Fé?

Há gestos de simplicidade inefável ou inenarrável que, por mais palavras que utilizemos, elas não serão suficientes e nunca saberemos qualificar o alcance de muitos deles. Falamos, comentamos, classificamo-los e, sobretudo, se os admiramos profundamente, nem precisamos de os trazer à tona. Basta-nos contemplá-los ou tentar entendê-los e fazê-los nossos. Ficamos a remoer bem dentro do espírito o alcance de muitas atitudes que, ao serem feitas, nos levam a um mundo quase irreal, comparando factos conhecidos com os de um universo de gente que procura alienar-se do muito quanto se faz ou devia fazer-se para construir uma sociedade séria e sã.

Haverá sinais que acontecem por rotina ou medo de qualquer castigo, outros serão fruto de instinto natural e os mais experimentados, provindos do íntimo de cada ser humano que acredita corresponderem tais gestos a algo acreditado e aceite.

Em qualquer situação os homens deveriam ser eloquentemente espontâneos, baseando-se no sentido da verdade que reconhecem e seguem. Este sentimento abrange os mais diversos meandros da vida, políticos, sociais ou religiosos.

Bem se vê que, hoje, muito do desporto se abraça como uma máquina poderosa, onde é contado o dinheiro às toneladas. Nas praças públicas vendem-se homens como se fossem verdadeiros caramelos, sendo menos regateado o seu preço do que o da habitação para abrigo de uma família.

O desporto, com as variações concomitantes, deveria ter sido, naturalmente, inventado nas suas variadas classes para a boa saúde física e moral dos homens, mulheres e crianças. Passou, todavia, a ser considerado e seguido como fonte de riqueza para muitos privilegiados. Quem não atina com a bola, o dardo ou a seta, pode arrumar as botas e dependurar-se nos cabides da inutilidade.

Ainda que bastantes famílias prossigam na materialidade desportiva e para aí puxem os seus filhos, o certo é que também muitos jovens são atraídos a verem no desporto um meio e momento de afirmações várias daquilo que é a sua vida séria com empenho nesse testemunho.

Acabaram, há tempos atrás, as competições olímpicas. Arrastaram consigo um exército de participantes, nas mais diversificadas modalidades e nelas os milhares de atletas mostraram o poder da sua musculatura física e anímica. Desenvolveram rivalidades sadias, emocionaram-se com variadíssimos pretextos e até construíram amizades perduráveis e indestrutíveis, conhecendo, mutuamente, pessoas e costumes diferentes.

É certo que foi um acontecimento, onde algumas forças do mal intentaram irromper, no intuito de desestabilizar a fraternidade humana e, por isso, muitas vozes se fizeram ouvir num protesto veemente que terá deixado desassossegadas as consciências de quem sempre procura penetrar e romper quanto deveria tornar-se fonte de união de povos, línguas e costumes.
Interessantes foram alguns momentos que houve quando muitos jovens não tiveram pejo ou vergonha de manifestar o lado espiritual da vida. Quero rememorar, por exemplo, o porte daquelas duas jovens que, no fim da competição em que uma ganhou, claro, quando ambas, abraçadas e alheadas de rivalidade, foram capazes de dizer, alto e bom som, que qualquer vitória ou derrota deveriam ser instantes de gratidão, prestados à glória a Deus.

Por tal, interrogo-me sobre os gestos de muitos desportistas que entram num campo para a competição a fazer sobre si o sinal cristão da Cruz, repetindo o mesmo ao longo dos lances mais vivos e cruciais do jogo.
Não importa que credo professam.
Perguntemos se será mera superstição.

Estou em crer que não, pois o desporto ainda continua a ser, para muitos, incentivo de cultivar um corpo são no qual se apoia e sustenta uma alma sã e crente.